Imagem retirada da página Castanheira de Pera Castanheira de Pera, 2018 |
Podia estar entusiasmada com a aproximação do meu aniversário, com o facto do blogue fazer dois anos (já dois anos?!) ou até por estar, finalmente, no fim da minha licenciatura... Mas estou triste, ando triste só. Tenho tantos motivos para estar feliz, tenho pessoas maravilhosas à minha volta, sinto a vida minimamente sob controlo (e eu que gosto de controlar tudo...), tenho realizado os meus objetivos, mas não estou bem, confesso. Nunca voltei a ficar realmente bem depois daquele pesadelo... Sei que não sou fraca, mas estamos numa altura em que ser de Castanheira de Pera e ter estado no meio daquilo que aqui se viveu é demasiado pesado. Eu não passei absolutamente nada em comparação ao que tantos sofreram, mas continuo a sonhar com as chamas e a acordar em pânico, sonho com o fumo, com casas a arder, com pessoas a gritar. Tantas e tantas vezes, olho pela janela e parece-me ver uma coluna de fumo ao longe, onde há uma nuvem ou até nada, é só o meu medo. A minha ansiedade sobe com o cheiro das queimadas... E aquela maldita antena, na encosta de lá, arde na minha mente, de cada vez que vou à varanda.
Sinto o dia 17 a aproximar-se e algo dentro de mim parece ter a certeza que vai acontecer tudo de novo, embora saiba que, pelo menos aqui, deve ser impossível. "Vamos morrer", pensava, enquanto não se via nada à nossa frente, tal era quantidade de fumo na rua, mal sabendo eu o que, por aquela hora, já tinha acontecido a tantos... E acredito ter sido isso que me marcou ainda mais: nós estávamos sem comunicações, sem meios que nos permitissem saber o que se passava a uma distância tão curta de nós e, enquanto tudo acontecia, eu estava numa espécie de bolha, com medo mas minimamente protegida. A informação, o número de mortos, de feridos, de perdas, as imagens (repetidas, ainda hoje, vezes sem conta), os testemunhos, o pânico de uma comunidade a ser mostrado, constantemente, durante dias, semanas, depois de já ter acabado tudo, foi escavando uma marca ainda mais funda.
Não acredito, realmente, que sou fraca, mas lido com as coisas de forma demasiado emocional, fico presa aos acontecimentos. Talvez seja a minha ansiedade, talvez a minha personalidade, não sei... Mas uma coisa é certa: sinto-me incapaz de "celebrar" ou participar em "comemorações" de uma data que gerou tanto sofrimento a tanta gente, que continua a ter repercussões na vida daqueles que estavam aqui, naquele momento. E quando dizem que não devemos esquecer o dia 17 de junho de 2017, peço desculpa, mas eu só queria, por vezes, conseguir apagar da minha memória o que aqui aconteceu. E peço desculpa também àqueles que têm uma forma diferente da minha de lidar com a situação e de, talvez, superar o que aconteceu, mas eu não consigo aceitar que relembrar seja fazer menções honrosas (com todo o meu respeito, consideração e apreço a todos aqueles que sofreram para ajudar os outros, claro!), nem é erguer estátuas, nem fazer daquele dia uma espécie de feriado. Relembrar, para mim, seria introspecção, seria pedir paz - pensem em fé, se assim entenderem. Seria ainda, em comunidade, repensar os erros e corrigi-los, seria tomar como exemplo tudo de mau que aqui aconteceu para que não voltasse a acontecer em lugar nenhum... Mas vem aí o verão e duvido que algo tenha sido verdadeiramente feito.